sábado, 30 de outubro de 2010

Esse cara é uma viagem!

Foge um pouco ao assunto, mas faz parte... Tenho ouvido tanto esse disco, que acabou se tornando trilha sonora provisória da viagem. Tom Zé. O cara é realmente uma viagem. Grande amigo Ramon que veio há uns 15 vanos com um cedê do ótimo "Com defeito de fabricação". Veio dizendo que o cara era uma espécie de Zappa Brasileiro, pela inovação, talento e desrespeito completo à ordem vingente. Me amarrei tanto que fiz algo de inusitado para mim. Achei o bendito cedê em promoção numa loja, comprei os sete que haviam e distribuí para os próximos. Achei que algo bom assim tinha de ser difundido. Daqueles anos pra cá, eu nunca mais soube parar de ouvir esse baiano. E agora acabei de descobrir esse que é o seu segundo disco. Maravilhoso!!! Preciso dividir com vcs!!!

terça-feira, 26 de outubro de 2010

Como é que faz... (PT2)

(Continuação do post anterior)
Bonitinhos!!!

Pedalando... É aí que é gostoso e sofrido numa coisa só!!! "Ingual amorr". Mas é lindo o passeio, cheio de mar e de nuvem e de florzinhas coloridas. E casas de madeira antigas que eu gosto tanto, e umas pessoas trabalhando a terra com umas vaquinhas lá deitadas tranquilas. Depois é um riozinho e tem lagarto e passarinho conversando. Até golfinho tem. Daí vem a ladeira e a gente esbafori muito e para cansado com o coração a milhão e vai... Só pra ver uma linda paisagem no alto daquele morro e descer bem rápido correndo.

Pausa para um lanchinho.
Almoçando... Pra isso não tem regra nenhuma. Tem vez que é um restaurante de posto com um buffet livre de sete reais, outra é um lanche, e outra são três bananas e duas barrinhas de cereal. Se estou parado em alguma cidade procuro comer algo tradicional quando há. Não tem feito muito calor, mas em viagens onde ele fez, eu parava, cozinhava, comia, escrevia e dormia um pouco. Mas nessa não tá assim.

Traquitanas para jantares salgados e arenosos...


Jantando... Também não há certeza. Mas tento cozinhar. Pode ser couscous com lentilhas e algum vegetal, uma sopa de ervilha seca, um camarãozinho com purê... Teve um dia na Ilha das Peças em que acampei na praia deserta linda. Mas a noite, o vento fazia bastantes dos seus costumes soprados. Improvisei técnica assaz inteligente de enterrar a panela e o fogareiro de maneira engenhosa. Esta geringonça resultou-me um jantar arenoso ao qual adicionei bem mais sal do que deveria, uma verdadeira delícia.

 


Depois é deitar e ler ou escrever um pouco. Acabei recente de ler um livro que posso indicar sem dúvidas, mas com ressalvas!!! ''A Assombrosa Viagem de Pompônio Flato", do Eduardo Mendoza. Uma grandiosa aventura na qual um Jesus de 6 anos de idade, Maria e José são personagens, de onde a ressalva. Incrível presente da querida Cris.

Ainda estão faltando alongamento e meditação na viagem, eles devem estar pedalando um pouco devagar, mas sei que eles vão chegar...

sábado, 23 de outubro de 2010

Como é que faz... (PT1)


Camping de Matinhos
Queridos hospitaleiros. Dona Zena e o Velho Balan
Uma amiga Lúcia disse outro dia que as pessoas perguntavam, mas como ele faz, como ele dorme, o que ele come??? Percebendo não ter respostas para essas perguntas, aconselhou-me a contar  um pouco da pseudo rotina que me ocorre. É um pouco difícil na verdade, pois sou uma pessoa esquizofrenicamente dividida entre um grande rigor organizacional e o caos completo. Mas vamos tentar. Vou quebrá-lo em dois para não ficar comprido demasiado.

Dormindo... Tenho usado muito campings. Quando atravessei a França de bicicleta em 2005, dormia quase somente em cantos de mato de alguma propriedade ou em beiras de rio que em que aproveitava para descarregar a nhaca de dois, três ou quatro dias de pedal!!! Mas as estradas por onde passei eram bem pouco movimentadas. Nesta viagem, como tenho ficado muito próximo ao mar, e sendo este corpo tão querido aos humanos, sinto-me um pouco menos tentado ao camping selvagem pela abundante presença próxima de seres dotados de 32 dentes. Mas também me ocorre de ser convidado a dormir e comer pelas pessoas do caminho, e isso é uma delícia... 
Yo e mi Cloclô
Acordando... Sem hora fixa, mas não varia muito. Quando fica claro na barraca, acordo e começo o movimento de dobrar o saco de dormir, empacotar as coisas, desarmar a barraca, dar uma checada na bicle e carregá-la com os 32 quilos de tralha que nos acompanham. Em meio a este processo também faço uma banana amassada com minha pauer granola pessoal e mel, como algumas frutas frescas e secas e caio na estrada, passando numa padaria pra comer um queijo quente e uma média. Por falta de pressa e por gostar das minhas bugigangas bem organizadinhas sobre a Clô, isso quase sempre ocorre entre as dez e o meio dia.

Volto na segunda contar o resto... Bom final de semana pra vcs!

quinta-feira, 21 de outubro de 2010

Bombinhas não existe mais!!!

Alguém aí tem um bagageiro sobrando?
O pequeno balneário parece ter sido assolado por uma chuva de concreto mediocremente organizada em forma de casas, lojas  e pequenos prédios de três a cinco andares. Tudo assim, um colado no outro pra ficar bem lotado... Coisa de velho essa de ficar reclamando dos resultados do progresso, mas é que foi triste a volta vinte anos depois. Já me haviam falado que a coisa tinha construído muito por lá, mas nem isso poupou-me o choque.
A milésima gambiarra a gente não esquece...

O pedal havia sido complicado naquele dia, longo, cansativo, cheio de lombas graves, e com mais uma quebra de bagageiro (perdi a conta de quantas já foram!!!). Como minha milésima gambiarra não surtiu grande efeito, tive que pedalar à noite, de Bombas a Bombinhas com os bagageiros sacolejando no guidão. O trajeto não é longo, mas desta forma foi bem difícil. Desagradável minha surpresa ao descobrir que o camping onde vivi tantos momentos agradáveis muitos verões atrás, cedera lugar a um horrendo condomínio. Passou-me na cuca aquele filminho  de conversas à noite entre os primos e amigos, o ribeirão onde pescávamos pitus, a linda  e voluptuosa namoradinha argentina e a esquadrilha da fumaça que quase fazia as barracas levitarem feito balões!!!

Bombinhas
Mim gosta ganha dinhero
Ali estava eu, exausto e expulso de meu paraíso adolescente. Tive que vencer mais uma lomba para chegar ao camping mais próximo, na praia do Retiro dos Padres. Esse lugar continua lindo, mas ao que ouvi dizer os bons homens do clero já o puseram à venda. Como bem sabemos, estas amáveis gentes embatinadas não são dadas a andar longe de seus cofrinhos. "Mim qué rezá, mim gosta ganha dinhero".

Depois passei alguns dias no apartamento de meus tios na praia ao lado. Mariscal também foi bastante moldada pelo concreto, mas ali houve ao menos um tanto a mais de respeito pela orla marítima, com uma certa distância entre as habitações, bem poucos prédios e somente de até três andares e nada deste ostentatório método alpinístico de se construir morro acima.

Vista do Canto Grande em Mariscal
Só atinei para o fato de que por um longo tempo ali pedalando, parecia haver algum tipo de proibição às casas de um pavimento, até que mais para o canto as vi!!! Mas bem, sempre terei as memórias e a sorte de ter vivido o que ali vivi. As fotos para ilustrar, serão as que me agradam. Até porque não me ocorreu fotografar o desparelhado maciço arquitetônico local. Melhor olhar para o mar cristalino, esquecendo propositalmente de olhar sobre os ombros, e seguir pedalando...

segunda-feira, 18 de outubro de 2010

Era para os pássaros, hoje quem quiser que voe!


Vinha eu alegre pelo caminho, passando por lugarejos bem demais bonitos. Engraçado porque já vim tanto pra esse litoral de Santa Catarina, que me surpreende o quão pouco dele conhecia. Itapocoroy em Penha achei uma graça. E logo depois, pra ser teimoso, peguei uma lomba boa de terra bem na beira mar, indo contra os avisos de um bem simples senhor. Danada ladeira me fez suar bicas, mas trouxe compensações longes de minha pré-imaginação. To ali sofrendo mais uma subida e me aparece um mirante pouco usual, todo coberto de uma graminha verde e com um simpático motorhome antiguinho estacionado. De trás me sai um figura bem suado com uma foice na mão em pleno feriado.Fazemos olá,  pouco conversando nos reconhecemos como elementais da estrada que somos. Pouco depois, Barra Velha, como se apresentara meu novo amigo, saca de uma mochila gigante aquele mágico aparato que faz voar.Já fiz inclusive curso e poucos vôos de Parapente e tenho grave loucura pelo negócio.Logo estava ele lá, feito as gaivotas que eu vinha invejando pelo caminho, sobre uma paisagem deslumbrante.
 
Depois mais um e outro, até que pintou o Jackson. Instrutor da coisa e praticante de Vôos duplos. Expliquei-lhe minha situação monetária e ele me fez um grande desconto com cervejinha e almoço inclusos. Minutos depois, lá estavamos nós, a 800 mts de altura sobre o mar e montanhas cobertas de mata atlântica. Praias e mais praias à vista e uma suave brisa no rosto. Inevitável ser redundante ao falar sobre a inexplicabilidade das sensações, até porque, ali vc não pensa...

Absolutamente maravilhoso. Logo após ele ainda fez um vôo triplo com seu casal de filhos pequenos. Pensei da sorte daquele garoto que já voava assim desde os três anos de idade. Deixei aqueles companheiros do ar com uma alegria imensa no dentro, tanto pelo presente que me deram, quanto pela escolha de vida que fizeram. Sei que são pessoas melhores do que seriam por vivenciar frequentemente este extase, pois não são orgulhosos disso, simplesmente voam.





sexta-feira, 15 de outubro de 2010

São Chico do Sul... Cidade linda.

Pier em Vila da Glória
Lá se iam quase trinta anos sem ali pisar. Cheguei por caminho dos menos comuns. Vinha sofrendo os 28 km que separam Itapoá de Vila da Glória através de uma estrada de terra, melhor dizendo, de barro! Fiz uso de uma pequena embarcação comercial para chegar à Ilha de São Francisco. De longe já se percebem alguns edifícios bem antigos, e desembarcando, o ar agradável de uma pequena cidade histórica. Estas cidadezinhas muito me agradam, principalmente após ter vivido em Pirenópolis GO. Descolei uma pensão razoável e de preços módicos, e fui dar comida às mídias sociais, principalmente esta que vcs lêem agora, meu xodózinho, o blogue... A lan hose encontrada era bastante colorida e habitada por senhoritas portando poucos panos e vastos decotes, sem nenhuma economia de maquilagem. Jovens que me pareceram chineses falavam efusivamente em alguma linguagem oriental. Como estávamos muito próximos ao porto da cidade, não me foi tão difícil chegar à conclusão de que estava visitando a primeira prostibulanhouse de minha vida! Pena ter me faltado o senso de fotografá-la. No dia seguinte, após arrumar minhas tralhas sobre a bicle (isso leva um tempo desgraçado!!! e quando acampo piora!) Saí de andada, vidiando e fotografando a bela cidade.
É isso aí Amyr, esse é o cara! (Foto noMuseu do Mar)
Houve mais de um canto que me tentou fisgar, como se São Chico Sereia do Sul me quisesse fazer desviar da trilha e estabelecer ali morada. Conheci a diretora do belo Museu Nacional do Mar, que me apresentou ao seu Raul, senhorzinho franzino e agradável de 83 anos, 70 dos quais dedicados ao mar e ao que o encima, os por nós ditos barcos. Hoje é responsável pela restauração de tudo que é embarcação que mora naquele museu. Com ele travei agradável papo sobre os idos enquanto ele me mostrou inclusive uma canoa que teve talhos cravados por nosso atual presidente, ainda candidato na época. Depois fui, deixando cuidadosamente ali um pedacinho de mim pra voltar buscando numa outra vez.

segunda-feira, 11 de outubro de 2010

Eu não vou tomar droga nenhuma !!!

Exemplo de Complemento (Não foi o que eu vi!)
Um amigo da estrada esses dias me alertava sobre a necessidade de se compensar com muito cuidado minerais e nutrientes consumidos durante a viagem. Ele mesmo já havia feito um bom trecho de bicicleta, e sob orientação de uma personal trainner, recorrido ao uso de alguns complementos. Eu lhe disse que tentava fazer uso apenas a uma alimentação balanceada, com lentilhas e cuscuz (por seu rápido cozimento, alto teor proteico e de carboidratos respectivamente), frutas secas oleaginosas (especialmente a castanha do pará, por serem muito calóricas e com muitas propriedades interessantes), frutas frescas (sobretudo banana por conter muito potássio), frutas desidratadas em geral (por propriedades e facilidade de transporte, como os itens anteriores), mel e uma granola de meu preparo que leva entre outros flocos de quinua, gérmen de trigo e levedura de cerveja.

Meu interlocutor disse que ainda assim eu deveria recorrer a complementos de proteína, maltodextrina  e outros de que não lembro o nome. Para não ser teimoso fui à farmácia ver o que havia nesse sentido. Estudando bulas, e que me corrijam os que compreendem melhor o assunto, li que um dos melhores ali encontrados, trazia 5 gr da substância em questão por dose indicada para consumo diário, mas se tomado com leite, o total de proteínas era de 16 gr. Ora, ou bem este produto multiplica-se protéicamente quando tomado com leite, ou o leite simplesmente contém mais proteínas do que esta joça de 60 reais o potinho. Prefiro caprichar então no leite, queijo e ovos, visto que não sou dado ao consumo de carne, e não tomar droga nenhuma!!! Verdade que aumentar a dose destes itens tende a provocar fortes flatulências, mas soube que os complementos também o fazem. O jeito é dormir com a barraca aberta e aproveitar esse gás durante o dia como propulsão extra ao pedal, assim como uma espécie de turbo gastro-intestinal...

sábado, 9 de outubro de 2010

Tão simples e tão agradável.

Verdade seja dita, não sou eu o mais católico dentre os seres humanos. Nem tampouco ligado à outras religiões quaisquer, apesar de um certo interesse em alguns tipos de Budismo. Mas ia eu por uma dessas estradas bonitinhas margeadas de mata atlântica, quando avisto uma pessoa trabalhando próxima. Aceno-lhe a cabeça como costumo fazer, e este homem me devolve um sorriso realmente lindo. Olha um pouco a cena, e toda essa bagagem e diz, ''que Deus lhe acompanhe.!'' Mas o fez com tamanha convicção e simpatia que foi realmente tocante. Percebi que até havia alguma curiosidade em seu olhar a respeito de minha jornada, mas isso não era importante. Importava-lhe proferir aqueles votos. Sei que seu dizer em nada combinava com a companhia de um velho barbudo sisudo e severo que me vigiaria e a quem eu deveria temer. Aquele homem, à sua maneira, desejou-me todas as boas coisas possíveis. Ele quis que tudo o que existe me invadisse e acompanhasse. E a isso eu digo amém!!! Obrigado amigo...

quinta-feira, 7 de outubro de 2010

O apoio que faltava!!!

Parece bem bobo escrever um post a respeito de um apoio vulgo "pézinho". Mas eu digo quer não é! Até poucos dias atrás eu só contava com o apoio central, mais comum em bicicletas normais. Acontece que por si só ele não aguenta o peso de uma bicicleta carregada para viagem. Parar a Clotilde estava sendo um verdadeiro calvário, sempre com todo um malabarismo necessário, e mesmo assim as quedas ocorriam. Tencionando encontrar pessoas de Curitiba em Morretes, liguei ao meu primo Ricardo (ele não há de gostar que eu entregue seu apelido de infância aqui, o teta, mas como evitar...) que me trouxe um segundo destes artefatos que se encaixa na parte traseira do quadro da bicle. Agora com dois pezinhos, ninguém segura minha Clô. Ela faz isso sozinha!

quarta-feira, 6 de outubro de 2010

Um ótimo dia...

     A chuva que insistia há dias deu uma folga finalmente. Pude então deixar Morretes e seguir viagem rumo à Matinhos, de onde agora escrevo. Foram 69 km de lá para cá, e esse é por hora o recorde de percurso em um dia desta viagem!!! Verdade que o trajeto era bem plano, com excessão dos primeiros 13 km, (Afinal uma cidade não pode se chamar Morretes por nada!) mas devido ao peso de nosso fardo, acho que podemos considerar esse numero como bastante satisfatório. 

Igrejinha no Caminho
     Também senti menos os joelhos e ouso dizer que as subidas não são mais as mesmas, e isso não por questões geográficas, e sim porque estamos pegando algum ritmo! Além disso, tivemos um agradável solzinho ao fim da tarde, com uma belíssima luz. O camping encontrado é bonito, organizado, fica no sopé de uns morros lindos e pertence à um casal muito bacana que ao ouvir sobre a jornada me deram 100% de desconto!!! Tudo indica que dormirei bem...

domingo, 3 de outubro de 2010

Cultura caiçara e proteção ambiental. (03/10/10)

Estação Ecológica da Juréia
Cruzando este litoral onde se encontram São Paulo e o Paraná, tive contato com um assunto interessante e delicado, que remete basicamente à esta espécie de esquizofrenia coletiva que faz com que o homem se perceba como um ser desintegrado da natureza. Daí nasce esta ânsia de subjugar o  ambiente causando os nefastos efeitos com que estamos acostumados a lidar e que com muitos dos quais até nos acostumamos. A partir desta falácia, a sociedade percebe a necessidade de cercar alguns pequenos pedaços onde resistem a fauna e a flora, e deles expulsar a ocupação humana, sem perceber que em muitos casos e ao contrário do senso difundido, é justamente quem ali está que protege o que restou. Isto ocorre geralmente em nome de um pensamento ecológico importado e atrasado, mas que muitas vezes encobre interesses econômicos de gente que se faz de inocente.

Dados mostram que 25% dos brasileiros ainda reside em comunidades tradicionais. E sempre, onde há algo que se pense em proteger, lá estão estas incômodas pessoas. Ali se inicia o árduo processo de convencer esta gente de cabeça dura de que eles devem sair dali para que se possa delimitar e "proteger o que restou". Mas seria mesmo uma coincidência o fato de que na maioria dos casos, o "que restou" está quase sempre "habitado". Num esquema de ocupação tradicional, herança da cultura indígena, a mata é o quintal dos indivíduos que ali residem. Sua proteção está portanto intimamente ligada à subsistência dos mesmos.
      Um bom exemplo disto são os grandes parques no cerrado brasileiro em que não há habitantes. Quando vem o fogo, queima tudo, pois não há ninguém próximo para apagá-lo no início. É claro que incêndios também são causados por métodos tradicionais de cultivo como a queimada, mas isso se resolve com a conscientização de que existem técnicas mais modernas e assertivas, e não com a expulsão daquele que seria o maior interessado em proteger esta área. Outro exemplo disto ocorreu durante os anos 80. Por achar que o Palmito Jussara da Mata Atlântica estava em perigo devido à sua exploração econômica, o Paraná proibiu sua extração. Santa Catarina não o fez. O resultado foi que em pouco tempo, as matas catarinenses mantinham estas palmeiras, enquanto as mesmas praticamente desapareceram do estado vizinho. Isso mostra o óbvio, onde se podia colher, havia manejo e proteção por parte dos moradores locais, novas mudas eram plantadas e se respeitavam alguns espécimes para a reprodução. Onde havia a proibição, não havia tempo ou interesse para manejar e as plantas eram retiradas na calada da noite.

Clotilde embarcada
     A natureza se recupera e até se beneficia de um esquema de ocupação tradicional. Existem estudos que comprovam inclusive que a Selva Amazônica foi toda "manejada" pela ocupação indígena, o que auxiliou inclusive na dispersão de espécies e consequente aumento da biodiversidade. O caiçara conhece e respeita os ciclos naturais, caçando e pescando nas épocas corretas, evitando os períodos de reprodução dos animas, simplesmente por depender deles. A terra é cultivada num sistema de manejo onde cada parcela descansa o tempo necessário antes de voltar a ser semeada, não necessitando assim de qualquer aditivo químico. Há um respeito consciente à natureza por se conhecer profundamente o caráter simbiótico desta relação. Logicamente existe a necessidade de educação junto a estas comunidades para que se possam inserir novas técnicas de manejo da floresta com métodos cada vez menos impactantes e que tragam maiores benefícios aos extratores. Mas isto deve ocorrer dentro dos moldes culturais da gente local, através de seus indivíduos, como já vem ocorrendo há algum tempo pela cooperação de caiçaras que ampliam seu campo de visão formando associações como o MJJ (Movimento dos Jovens da Juréia) e as raras ONG's que tem realmente uma visão moderna e produtiva da questão.

     Além disto tudo, no momento em que estes povos constroem, reformam ou preparam o terreno para novos plantios, tradicionalmente ocorre o mutirão. Este trabalho comunitário coletivo que proporciona obras muito rápidas e baratas, também resulta em momentos de festa, alegria e cultura. O proprietário fornece comida e bebida, e após o término do trabalho começa o Fandango, também ocasionado por motivo de casamentos, aniversários ou festas de santos. Ali se vê uma série de cantos e danças, ritmos diferentes, roupas e adereços tradicionais, instrumentos musicais fabricados artesanalmente, etc. Estas ocasiões são pontos culminantes de um estilo de vida com tudo que pessoas precisam para se sentir honradas e orgulhosas de seu trabalho e cultura, com muita diversão.

    Quando isto não ocorre porém, e estas populações são rechaçadas de seu habitat, algo muito diverso acontece. Aumentam as periferias de cidades vizinhas como Peruíbe ou Iguape, no caso da formação da Estação Ecológica da Juréia. Muitos destes indivíduos, aculturados e sem conhecimentos para obter renda fora de seus contextos, acabam caindo nos braços de um estilo de vida marginal, onde a revolta, ainda que não seja o melhor, é um caminho quase natural de quem perdeu tudo, principalmente a dignidade. E este homem que vivia em comunhão com a natureza, torna-se um animal perigoso na selva de pedra. E tudo isso porque temos uma aversão ao fato de sermos bichos, quando na verdade, isso nos torna um com o todo. Quando recuperarmos este entendimento, este será o dia em que nosso desenvolvimento será real, e não mais poderemos ferir a vida por falta de respeito, visto que somos vida.