Hoje aqui em Porto Alegre, vontade incrível de sair pedalando... Nada contra a cidade ou as coisas como tem sido por aqui até agora. Muito pelo contrário, pois estou com amigos queridos, alguns dos quais nem sabia que estariam por aqui, e as pessoas que tenho conhecido também são bastante especiais e agradáveis, e muito gentis ao me hospedarem em sua eclética comunidade.
É só uma sensação de não pertencer aqui. Não Porto Alegre, mas à entidade citadina. Neste momento, pareço não poder encaixar em centro urbano algum. Somente a imensidão das praias, campos, matas e estradas parecem me abraçar e confortar. O olhar no infinito como única forma de aplacar um tipo diferente de solidão, que pareço só saber sentir em meio a paisagens urbanas. Paradoxal que seja, sinto-me menos só quando sozinho rumo ao desconhecido.
Também preciso confessar que andei trapaceando, e ainda mais, isso não para aqui!!! Mas sou capaz de jurar que os motivos destas trapassas em nada se assemelham à preguiça ou desistência. O fato é que estou atrasado no cronograma geral devido ao largo tempo em Floripa. E, o grande motivo de estar rumando ao sul quando tenciono chegar ao Panamá, é estar em um centro de permacultura em El Bolsón, o Cidep. Caso ocorre que este centro só fica aberto até o fim do verão. Por este motivo venho recorrendo a algumas caronas de caminhão nos últimos 240 km, e devo ocasionalmente lançar mão de tais artifícios durante os 3200 km que me separam deste destino situado no norte Patagônico.
Pra quem quiser conhecer algo mais à respeito deste centro, www.cidep.org
E para quem tiver interesse no trabalho feito pela ong do pessoal que me abriga aqui em Porto, www.inga.org.br
sábado, 22 de janeiro de 2011
Sem saber a cidade...
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quarta-feira, 19 de janeiro de 2011
Querida erva daninha
Planta em banhado no lugar de acostamento |
Percebo agora que venho me indagando de forma inconsciente e há algum tempo sobre os diferenciais de se pedalar em uma grande estrada ou em uma pequenina senda de terra batida ou areia. Muitos são bastante óbvios. Nas grandes estradas, o barulho e o deslocamento de ar de caminhões é desagradável e até mesmo perigoso, também é mais difícil encontrar por ali aquelas pessoas, habitações e utensílios autênticos e interessantes que se pode vidiar nas entranhas da superfície. Por outro lado, se o acostamento for de bom calço, se pode avançar muitas léguas em um curto espaço de tempo. Mas algo que ontem me chamou a atenção de forma peculiar foi fato que não costuma sucitar grande interesse, mas que pareceu-me porém crucial nesse então. O corte de cabelo das beiras de estradas.
Capim de prata |
Fulozinha roxeada |
Quando morei no Goiás, tão logo entrassem em minha casa os habitantes locais traiam caladamente com os olhos sua necessidade de discrição à respeito da casa alheia. Nada falavam, mas seus olhares passeavam pelos vasos enquanto suas mentes se indagavam sobre que tipo de doido cultivava ervas daninhas dentro de casa, quando já era suficientemente árduo removê-las de seus quintais. Sempre gostei delas, não sei se era porque ninguém gostava ou porque sempre percebi que são lindas. Isso ainda foi crescendo em mim e foi imensamente reforçado quando soube que um artista famoso havia feito exposição em Paris de jardins compostos de "mauxherbes". Depois fui aprender com a permacultura que estas plantas tão resistentes, não só nos indicam carências e desgastes sofridos pelo solo, inclusive apontando os minerais necessários para sua correção, como tendem à recuperá-los elas mesmas, logicamente, ao longo de muitos anos.
Campos oníricos |
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segunda-feira, 17 de janeiro de 2011
Pitacos de realidade
Acelerando |
Agora vai!!! Indoàíndia acelerando total... Bom, ao menos se compararmos aos padrões anteriores de uma viagem homônima e de igual percurso feita pelo mesmo protagonista durante o mesmo período. 300 Km em cinco dias e contando!!! Com morrebas homéricas, areões gravemente movediços, temperaturas inclementes sob um tórrido sol escaldante, tudo diante das fuças inertes de hordas de veranistas embasbacados com tanto brio e fugacidade.
Pra ser bem sincero, os veranistas em geral tendem à nos olhar (pra quem é novo aqui, por nós compreenda-se "eu e minha bicle Clotilde") com um certo desdém, e até afastam-se um pouco, como se tais idéias pudessem lhes contagiar os miolos amolecidos pelo sol obrigando-os a pedalar eternamente rumo a não sei onde!!! E eu que procuro fugir dos hábitos de generalizar, julgar e mal dizer, me descontenho ao notar e compartilhar com vocês o quão abundante me parece estupidez generalizada do veranista padrão. Desculpem-me, pois não busco aqui em nada o caminho da violência, mas sinto saudades de estar viajando fora da temporada, quando quem está ali, ali pertence, sendo dali ou não.
Grande Thobias... |
Mas, voltando ao molho, acordando na casa do Thobias, desajunamos e parti rumo ao Ribeirão da Ilha, local que me agrada particularmente. De lá tomei um barco para a Praia do Sonho, depois Siriú por um morro com vistas e ladeiras de tirar o fôlego e finalmente Garopaba onde dormi. Alguns litros de mate com um colega de camping gaúcho me impediram novamente de sair cedo. Com sol forte na cuca fui até Laguna. Passei meio rápido por ali, pois abundavam os veranistas com seus respectivos aparelhos sonoros automotivos, mas muito me agradou o centro antigo. Dormi em um camping bem agradável e acordei muito cedo, mas ao arrumar a bagagem percebi uma nova ruptura no recém soldado bagageiro traseiro. E ali se foram umas boas 3 horas da gambiarra mais inacreditável que já operei nesta viagem, e quiçá na vida!!! Foi como se Chico Xavier sussurrasse os passos cirúrgicos em meus ouvidos com o próprio espirito de Macgayver encarnado em seu corpo!
Heitor e sua simpática pousada |
Após a balsa fiz amizade com o Heitor e acabei conhecendo sua simpática pousada iniciante na praia de Ypuã. Rumei então para uma sofrida pedalada por estradas de terra com aqueles murundunzinhos formados pelo vento e que nos impedem de avançar a mais de 8 por hora enquanto degustamos diferentes variedades de poeira gentilmente oferecidas pelos agradáveis veranistas em 4X4 que passam à milhares de quilômetros por hora.
Vista de sobre a duna |
Chegando ao Camacho comecei a pedalar pela praia, bem mais agradável apesar do vento sul entrando, o que também impede maiores velocidades. 5 km depois uma imponente duna convidou-me à dormir ao seu lado. Subi-lhe a encosta para perceber belíssimas cores pintadas pelo sol nas nuvens. Tomei um banho salgado, fiz um rápido couscouz com tomate, cebola e alcaparras, lambuzei-me as assaduras com hipoglós, e dormi agradavelmente ao som da chuva e das ondas.
Bem cedo estiquei-me um pouco na praia, ordenei as bugigangas, e pus o sul na cabeça. Quis sair da praia um pouco para evitar o vento e acabei por dar uma volta de uns 25 km!!! Mas, como há beleza em todos os lugares, esse caminho também era belo. Passei por Jaguarúna, Chuveirão (os nomes das praias são algo!!!), e voltei a pedalar pela areia. Fui bem por uns 20 km, e então vieram uns 6 de areia mole completamente inadmissíveis!!! Perdi a paciência e xinguei muito, para logo após rir de mim mesmo.
Meio necessária quando se está sozinho essa brincadeira de ser o idiota e o sábio, me parece um tipo salutar de esquizofrenia de combate à solidão... Ali faltavam poucos quilômetros até o Rincão de onde escrevo. Fui muito bem recebido e sem custos pelo João Pedro em um camping lindo que beira um lago incrível. Tirei o dia para revisar um pouco a Clo que estava empanada de areia e cheia de assaduras ferruginosas, escrever bastante pela primeira vez em semanas, tomar uns mates e descansar. Beijo a todos, e entre uma e outra divagação punhetofilosófica prometo voltar com pitacos de realidade.
Pra quem for pro lado de Laguna, recomento a Pousada Quinta do Ypuã do Heitor em uma belíssima praia, contatos emwww.quintadoypua.com.br
Já na região de Içara/Balneário do Rincão, o Parque Verde é uma ótima opção, com piscinas, toboáguas, chalés e camping. www.parqueverde.com.br
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sábado, 15 de janeiro de 2011
Alguém tem algo aí pra eu narrar?
arrumação matinal |
Pra não variar, saia já beirando o meio dia. Sempre às voltas com seu arrumar metódico matinal das traquitanas sobre a bicle, Z tinha este desagradável costume de demorar-se ante à estrada. O leitor vai apressar-se em dizer: Que mal tem que o rapaz saia um pouco mais tarde. Explico-me: Que faz o narrador de uma épica jornada enquanto o protagonista dá mil voltas em cordinhas e lubrifica parafusos??? Tais acontecimentos são inenarráveis, à menos que não se tenha vergonha de expor-se ao ridículo diante do mundo de narradores que passam a vida a narrar fatos esfuziantes e inverossímeis!!!
Mas finalmente saiu, rumo ao desconhecido, subindo lombas por muito graúdas e avistando as belíssimas praias e lagoas da fabulosa Ilha de Santa Catarina... Peraí, grita-me outro leitor: O cara ainda tá em Floripa?!!! Sim, queridos leitores, após 4 meses de jornada, o cara ainda tá em Floripa!!! Existe até uma foto do momento exato em que Z foi humilhantemente ultrapassado por uma lesma. Verdade seja dita, o molusco era imenso!!! (ele tem várias explicações para tamanha demora, eu particularmente, credito tudo à preguiça!) Bom, rumando sul desde o Rio Vermelho, 20 Km depois Z parava na lagoa Rodrigo de Freitas para encontrar amigos, compartilhar fotos e e proceder à arte de consertos mecânicos de bagageiros quebrados. Quando digo ser fastidioso narrá-lo, ainda há quem me xingue!!!
olhar inquisidor |
Nuvens negras acotovelavam-se no horizonte enquanto o sol já se apressava em brilhar chineses, quando Z partia novamente rumo ao infinito horizonte. Margear a lagoa durante o onírico momento do lusco fusco despertava-lhe sentimentos misturados de pura alegria pela beleza do instante, e de tristeza por despedir-se de Florianópolis e de tantas coisas que ali vivera durante os três meses recentemente decorridos. O manto da noite cobria a ilha e o céu derramava copiosamente suas lágrimas quando nosso herói fez pausa em um boteco no campeche. Pediu ao garçom que lhe trouxesse uma cerveja e sentou-se resignado a esperar Thobias, pois dormiria em sua casa depois de encontrar Digão, parceiro deste de longas pedaladas. E assim terminava o dia inicial do segundo ciclo de indoàíndia, com míseros 28 km pedalados e pouquíssima coisa de real interesse para contar, motivo pelo qual tive de florear abusivamente a narrativa. Z acha que foi um dia bom, agradável e produtivo. eu, narrador escolado de epopéias, pergunto-me: Como assim?!!! E, com este pensamento em mente, apago a luz e sonho com a rotina de um burocrata kafkaniano...
quinta-feira, 13 de janeiro de 2011
Tristeza não tem fim... Mas vira outra coisa.
Uns belos morros |
Logicamente tais acontecimentos provocam uma quase que obrigatória revisão geral de conceitos. Cheguei a cogitar fechar-me para balanço à ponto de largar a pena por hora, mas acho que explodiria caso não pudesse usufruir desta abertura aqui criada para aliviar-me um pouco a alma... Você leitor, chegado, colega, ilustre desconhecido ou produto imaginário, serve-me de psicólogo, amigo e padre!!! Obrigado...
Quebramos a barreira dos 1000 |
Outrossim, querem-me virar filme. Ou ao menos queriam, antes do sumiço, dar-me as condições para que eu me auto-filmasse, enquanto ao longe editariam isso tudo em capítulos da jornada. O estranho é que apesar disso fazer parte da ideia inicial do projeto, tenho minhas dúvidas se agora é um momento onde posso me expor desta forma.
Bom, hoje é isso. Aqui da Praia do Rincão, no extremo sul do litoral de Santa Catarina, em 11/01/2011, venho dizer à todos que estamos juntos novamente. Agradeço a companhia e até já. No próximo prometo ser um pouco menos subjetivo e contar algo mais jornalístico e talvez até emocionante.
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